As impressionantes investidas na região de Kharkiv em Setembro de 2022, cujos resultados foram extremamente positivos, consolidaram as posições ucranianas naquela região. Além disso, contribuíram para um gradual aumento das expectativas do povo ucraniano. E foi com as esperanças renovadas que a Ucrânia lançou a sua contra-ofensiva no início do passado mês de Junho.
No entanto, essas esperanças culminaram num cenário de perdas substanciais, levando os comandantes a reformularem a estratégia de ataques directos para uma abordagem de guerra de desgaste. Nessa nova táctica, o objectivo passou a ser a busca por ganhos graduais e contínuos, ao mesmo tempo que se preservam cuidadosamente os recursos disponíveis.
Cedo se percebeu que seria uma tarefa hercúlea rechaçar as defesas russas. Foi então que, no passado dia 26 de Julho, a Ucrânia iniciou a segunda fase (supostamente a principal) da sua contra-ofensiva, procurando penetrar nas linhas russas em dois grandes eixos:
– SUL (1 e 2), onde as forças ucranianas tentam avançar ao longo de duas linhas principais de ataque: uma, através da vila oriental de Staromaiorske em direcção à cidade ocupada pelos russos de Berdyansk, um porto no Mar de Azov; a outra, mais a Oeste, em direcção à cidade de Melitopol, um centro de transporte vital perto da costa.
– ESTE (3), onde os ucranianos tentam efectuar constantes ataques terrestres ao longo da linha Avdiivka-Donetsk.
Ao mesmo tempo, as forças russas desencadeiam as suas próprias operações ofensivas no Nordeste da Ucrânia, em torno da cidade de Kupiansk. Ao forçar a Ucrânia a defender, a Rússia tenta atrair forças ucranianas das áreas onde estão em manobras ofensivas.
Apesar do decurso de três semanas, é prematuro realizar uma avaliação precisa sobre este esforço. As forças de Zelensky estão actualmente empenhadas na tarefa de quebrar a primeira linha de defesa russa, mas é importante ressaltar que múltiplas linhas defensivas foram há muito tempo estabelecidas e estendem-se por uma distância considerável. Essa configuração representa uma limitação ao progresso ucraniano, o qual inevitavelmente será marcado por períodos de notável avanço táctico alternados com desafios significativos.
Mas pode esta contra-ofensiva ter sucesso?
Como em qualquer teatro de guerra, as circunstâncias são voláteis e a instabilidade no terreno altera o cenário constantemente.
Não restam dúvidas quanto à preparação das tropas de Putin para enfrentar esta contra- ofensiva. No entanto, a constante pressão inerente a uma campanha de considerável magnitude como a que está em andamento tem o potencial de criar fissuras nas linhas russas. Inicialmente, essas oportunidades podem manifestar-se em âmbitos locais, mas a perspectiva de penetrações mais profundas está no horizonte. Este revela-se como o curso de acção mais verosímil para o êxito ucraniano. A trajectória, contudo, será de natureza lenta. Substancialmente mais lenta do que o desejado pelo Ocidente. No entanto, é do Ocidente que provêm os meios essenciais para o esforço de guerra, uma condição imperativa para que a Ucrânia possa sustentar essa pressão.
O sucesso contínuo da contra-ofensiva não depende apenas da determinação das tropas ucranianas, sendo que a cooperação internacional tem um papel fulcral no curso dos acontecimentos. E o auxílio dos países ocidentais está a chegar tarde.
Adicionalmente, a Ucrânia enfrenta uma questão de magnitude alarmante: aproximadamente 35% do seu território está envolto numa complexa teia de minas, criando um campo minado praticamente intransponível. Este desafio ganha proporções profundamente preocupantes, uma vez que o país é altamente dependente da agricultura para a sua sustentabilidade económica. Uma grave situação que provavelmente exigirá anos para ser superada.
E assim se antevê uma guerra longa. E a sua duração pode estender-se ainda mais se o apoio fornecido pelo Ocidente à Ucrânia persistir na sua lentidão. A situação requer uma urgente reflexão, pois a assistência a “conta-gotas” pode prolongar e aprofundar o conflito.
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Nota: O autor escreve segundo a antiga ortografia.
Sobre o autor:
Advogado. Licenciado em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra. Aficionado por música e desporto. Entusiasta de História Militar e autor da página WWII Stories Group.