O futebol está nas bocas do mundo; não é de agora, mas o mundial tem a capacidade de colocar o espectáculo, ainda mais, na agenda mediática.
Quero-vos falar de futebol, mas não quero falar de futebol. Muito menos da escolha do Catar, porque a FIFA, o Comité Olímpico, a FIA, sempre foram pródigos em levar os valores do Olimpo, da igualdade, do mérito, da conquista assente na lealdade, a locais onde esses mesmos valores não existem nem num livro ou página de internet, quanto mais a sua prática.
Também não vos quero falar da ida de altas figuras do Estado ao Catar. Para mim eles não deveriam ir sequer a Badajoz, quanto mais às arábias. Receio que isto continue a demonstrar a nossa pequenez, a nossa saloiice, uma tentativa de agradar ao povo, de ser como o povo. Creio que o povo quer é bons governantes, bons representantes do estado, que lhes proporcionem melhores condições salariais, uma educação mais igualitária, serviços de saúde mais acessíveis, maior eficácia energética, regras ecológicas claras a médio e longo prazo, acesso geral à cultura. Não acredito que o povo queira saber da táctica da Selecção através dos Srs. Presidente da República, da Assembleia da República, do Primeiro Ministro ou de qualquer Deputado, Presidente de Câmara, etc.
Tenho 40 anos, cresci numa época onde havia dois canais de televisão. Aos Sábados e Domingos à tarde, o Canal 2 dedicava-se, quase em exclusivo, ao desporto, na verdadeira acepção da palavra. Porque lá apareciam todos os desportos, maioritariamente amadores, ainda sem a segmentação que o Rotações, primeiro, e os programas de desportos radicais, já com a SIC, vieram trazer.
O fim-de-semana desportivo era preenchido com jogos de andebol, hóquei, atletismo, dressage, etc. Era pluricultural!
E nesses desportos todos, o que mais me agradava, para além dos motorizados, era o hóquei. Ainda é! Tem rodas, tem velocidade, há intensidade e precisão. Além do hóquei ser a modalidade em que Portugal e os clubes e jogadores portugueses mais sucesso têm. Se os nórdicos vibram com o curling, os portugueses vibram com o hóquei em patins. Há muitas décadas.
No futebol, vivemos da clubite, o futebol é um produto das grandes agências de comunicação, em conluio com a comunicação social e os grandes anunciantes. Temos clubes medianos e uma selecção que, segundo os especialistas, teve como pontos altos o Mundial de 1966 e o Europeu de 2000.
Pessoalmente, na televisão, confesso que acho o futebol enfadonho: o jogo, os jogadores, os comentadores. Não há brilho, não há emoção. Ou se há, é um rácio baixo para 90 minutos de jogo.
E na rádio?!
Ainda hoje ouvimos falar de Di Stefano, Garrincha, Pelé, o nosso Eusébio, o melhor jogador do mundo. Nenhum deles era uma estrela da televisão e qualquer um deles, num mundo onde ainda não vivia na era da comunicação global, era conhecido nos quatro cantos do mundo.
Maradona, Beckenbauer, Chalana, Futre, Romário, já são de outra geração e, claramente, de outra forma de comunicar.
A magia da rádio é a palavra dita no lugar certo, como a literatura, e que tem a capacidade de nos fazer imaginar, sonhar. Ouvir um relato é delicioso porque há acção, há emoção, entrega, sacrifício; o campo, por vezes, tem dez metros e outras vezes um quilómetro. Os jogadores são bons, rápidos, quando falham fazem-no com estrondo e há chuveirinho no final do embate, porque a sonoplastia nos indica isso. Se é real?! Não sabemos, mas o futebol tem que ser espectáculo, e os radialistas sabem melhor que ninguém fazê-lo.
Quantas vezes já vos aconteceu pensarem ou dizerem que determinado livro é bem melhor que o filme que se apropriou do seu texto? O futebol, na rádio Vs televisão, vive da mesma fórmula. A rádio tema capacidade nos fazer imaginar, enquanto que a televisão nos dá a realidade crua.
Já imaginaram o que seria Fernando Alves descrever o estádio de Zaha Hadid? Seria poesia.
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Nota: O autor escreve segundo a antiga ortografia.
Sobre o autor:
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