Revista Rua

2020-12-30T11:36:12+00:00 Negócios

Made in Situ: o projeto que luta pela preservação de um ofício

Os trabalhos refletem uma abordagem instintiva e sensível e geralmente têm uma narrativa baseada na natureza.
Noé Duchaufour-Lawrance ©Filipa Alves
Redação3 Dezembro, 2020

Made in Situ: o projeto que luta pela preservação de um ofício

Os trabalhos refletem uma abordagem instintiva e sensível e geralmente têm uma narrativa baseada na natureza.

Por Sara Araújo

Fundado pelo designer francês Noé Duchaufour-Lawrance, o Made in Situ valoriza uma profissão muitas vezes esquecida, o artesão, e reinventa-a com um toque de criatividade para que sobreviva na sociedade moderna. São várias as habilidades e os ofícios portugueses que renascem neste projeto, desde a olaria de Barro Negro da região de Tondela, o Bunho, uma fibra vegetal colhida por artesãos perto de Santarém, a Cortiça vinda do Algarve, a Pedra das pedreiras de Estremoz ou o Bronze de Peniche. Aliado a isso, o Made in Situ colabora com artesãos e segue a abordagem de “todas as mãos em uníssono”, isto é, há a mão que idealiza e a mão que realiza, entre as oficinas dos artesãos e o estúdio do projeto, resultando em peças únicas com histórias singulares. Em Lisboa, o espaço Made in Situ é um local de trabalho, mas, uma vez por mês, está aberto ao público para dar a conhecer os trabalhos deste projeto. Cada coleção tem um número limitado de peças, até por questões de sustentabilidade, e é cuidadosamente pensada, incluindo sempre uma contextualização para aproximar público e artista e dar a conhecer o processo criativo do trabalho em questão.

A primeira coleção criada por Noé tem o nome de Barro Negro e é uma colaboração de costumes ancestrais e transformações contemporâneas. É um trabalho made in situ, isto é, feito no próprio local e com pessoas do local. A sua relevância manifesta-se pela personificação de uma tradição que se encontrava ameaçada. O produto final abrange três inspirações oriundas das montanhas da Serra do Caramulo: os pedregulhos tombados pela paisagem mística, a comunidade de pessoas e a ancestral Soenga, uma técnica tradicional de cozedura onde a cerâmica é enterrada no solo. Esta última ditou o início da aventura. Noé queria saber mais sobre esta técnica de cozedura em covas e partiu à descoberta. Ficou a saber que, todas as primaveras, uma comunidade de ceramistas e oleiras reúne-se na aldeia de Molelos para cozer as suas peças. Inicialmente, as peças são pré-cozidas em chamas abertas e amontoadas numa cova redonda. Posteriormente, são enterradas com lenha a arder e cobertas com turfa, criando uma cúpula com pequenas aberturas das quais o fogo se alimenta. Estas aberturas acabam por criar uma câmara de ar, onde o barro é privado de oxigénio, absorvendo assim o carbono. Quando aberta, o Barro Negro, que resulta do processo alquímico, é revelado. Após esta investigação sobre a cerâmica negra, Noé procurou dois mestres artesãos da aldeia de Molelos, Alexandra Monteiro e Carlos Lima, e lançou-lhes o convite para fazer uma coleção. Numa primeira instância, os artesãos ficaram reticentes, mas acabaram por aceitar, com a condição de participarem em todo o processo, e vice-versa, aprendendo uns com os outros. Por exemplo, Noé teve de alterar os desenhos iniciais porque as peças iriam ser feitas numa roda de oleiro, logo deveriam ter uma forma circular. O designer acredita que a interconexão é a base de um processo criativo e, por isso, neste trabalho, procura transportar sensações vividas na aldeia de Molelos através das formas de cerâmica negra feitas à mão.

Para além da sua paixão por artesanato refinado, Noé Duchaufour-Lawrance já realizou vários trabalhos para espaços arquitetónicos, tais como Montblanc, Air France e Business Lounges do SFL, centros de Business Lounges #Cloud, o interior do Ciel de Paris e do Sketch em Londres e diversas moradias particulares. O designer nasceu em 1974 e ambicionava ter a mesma profissão que o pai. Para tal, formou-se em escultura na École Nationale Supérieure des Arts Appliqués et des Métiers d’Art e, a seguir, fez uma licenciatura em design de mobiliário, na ilustre Les Arts Décoratifs. Os seus trabalhos refletem uma abordagem instintiva e sensível e geralmente têm uma narrativa baseada na natureza.

Made in Situ
Travessa do Rosário, 16
1250-197 Lisbon, Portugal
gallery@madeinsitu.com
T +351 918 844 380

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