
Que mundo é este em que vivemos?!
Há dias, em Belfast, vi memoriais das vítimas das bombas dos anos 1960 e 1970. Coisas de há 50 ou 60 anos; parece que foi há muito. Mas nesses mesmos memoriais, cartazes, palavras de ordem comparavam o Sinn Féin e o IRA aos ISIS.
O ISIS foi fundado em 1999, criado em 2003 ou 2004 e o seu califado foi proclamado em 29 de Junho de 2014.
Ou seja, no Reino Unido – não estamos a falar de um país qualquer do terceiro mundo onde as pessoas não têm acesso à instrução -, há quem, nos dias de hoje, tenha ódio ao seu vizinho, por factos passados há 50 anos, fazendo comparações entre radicais… mas com uma dimensão completamente distinta.
No canal Odisseia começou a dar uma série sobre a Guerra da Coreia. Um documentário sobre uma guerra que pouca gente fala, mas onde, de 1950 a 1953 do século passado, numa pequena península, os Estados Unidos da América largaram mais bombas do que na Segunda Grande Guerra. Morreram mais de 36 mil militares americanos e cerca 7.700 desapareceram. Daí vem “a necessidade” de Pyongyang ter uma bomba atómica e misséis capazes de a levar por cima do Pacífico. Daí advém que sempre que um dos amados líderes espirra, o mundo democrático corra a comprar um pacote de lenços.
Estes dois exemplos demonstram bem a radicalização do nosso tempo, um dos piores factores da globalização e da era da comunicação, do mundo digital. Em vez de usarmos toda a nossa capacidade tecnológica e democrática para aproximar povos e culturas, cerramos fileiras.
É natural!
Vejam-se os jogos de futebol, por exemplo: o que importa é que o preto ganhe ao amarelo ou vice-versa. Não importa o mérito, os valores desportivos, não interessa a corrupção porque o fim justifica os meios. É assim desde as ligas mais avançadas até às camadas jovens, com os pais na bancada a canibalizarem o Olimpo. O que importa é ganhar, o que importa é que os nossos vençam; e para a vitória há toda uma série de desculpas, para a derrota é que não.
É a vida!
Como já tive oportunidade de escrever, os nossos meios de comunicação e a tecnologia ajudam a esse distanciamento cultural: a partir do momento que podemos escolher os conteúdos informativos, de entretenimento, culturais, económicos, etc., passamos a ser egoístas e a não ter a percepção de quem pensa diferente de nós. Quando se olha a sociedade, em vez de vermos pessoas iguais, mas com pensamento diferente, passa-se a ver um inimigo.
E é assim que entramos em 2020: com um vírus que provocou uma epidemia, vai provocar uma crise económica e uma crise política.
Como escrevia há dias o Rui Pelejão: “Depois de fechar as fronteiras qual será a próxima ilusão securitária dos portugueses? Isolar Ovar, pulverizar Felgueiras, encarcerar a ministra da saúde ou simplesmente acreditar que o mal vem dos outros e não está entre nós?
Vamos descobrir coisas muito piores do que o vírus. Os seus hospedeiros.”.
Recorro ao 1984, de Orwell, ou ao filme “V for Vendetta”, com Natalie Portman, John Hurt, Hugo Weaving e Stephen Fry: o controlo da população por parte dos governos começa depois de uma guerra ou de uma pandemia. Daí surgem líderes que usam mecanismos anti-democrátios, para resolver “o problema”. Ou os líderes moderados tomam as rédeas e apresentam planos sociais e económicos que não deixem ninguém para trás; um novo plano Marshall; ou teremos desemprego, fome e guerra.
Antes deste vírus a Europa já estava impregnada de radicais populistas. Se cada um deles é um pequeno fósforo, o COVID19 é um farrapo ensopado em gasolina, prestes a queimar a nossa civilização.
Nota: Este artigo não foi escrito segundo o novo acordo ortográfico.
Sobre o autor:
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