Revista Rua

2018-05-03T19:19:27+01:00 Opinião

Teremos sempre o Festival da Canção

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José Manuel Gomes
2 Abril, 2018
Teremos sempre o Festival da Canção

Março foi um mês “montanha-russa” de confirmações, anúncios de acontecimentos e novidades naquilo que acontecerá no Minho nos próximos tempos. Aconteceu mesmo muita coisa interessante, a começar pelos concertos de Mdou Moctar no gnration (com Bed Legs) e de Liima no café concerto do Centro Cultural Vila Flor, ambos no dia 22 de março. Foi o melhor de dois mundos no mesmo dia, separados por apenas 20 km de distância.

Entretanto, também no Centro Cultural Vila Flor é anunciado um concerto de Erlend Øye, músico e compositor norueguês, que é metade dos Kings of Convenience, a 19 de maio. Braga anuncia um novo acontecimento de música, o Braga Groove – que ainda não sei grande coisa sobre isto – mas que anuncia Yann Tiersen como primeiro nome. Melhor início é difícil. Por último (pelo menos à data que escrevo), é anunciado concerto de Feist para o Theatro Circo, a 8 de setembro. Para mim, Feist é uma das melhores artistas a solo a nível mundial: seja pela composição, seja pela voz única que tem. À hora que vos escrevo ainda não caí em mim com esta notícia.

Minho acima, desta feita no Festival Vodafone Paredes de Coura, para infelicidade de uns e gáudio de outros – tipo eu – Arcade Fire substituem Björk no último dia do festival, a 18 de agosto. Dia após dia há novidades, novos concertos, novas confirmações inacreditáveis e tudo por cá no nosso Minho. A melhor parte? Ainda vamos no primeiro trimestre do ano. A pior parte? Só se fala no raio da final do Festival da Canção!

Sim, eu sei, falar do Festival da Canção e de tudo o resto que mencionei aqui é misturar alhos com bugalhos, é falar de públicos absurdamente diferentes e de propósitos ainda mais díspares. O que eu me proponho aqui a analisar nem é a qualidade ou a falta da mesma, o mérito ou demérito. Acrescento até que nem vi ou ouvi o que quer que seja. Mas mesmo sem ver ou ouvir nada, sei quem ganhou, sei quem participou, vi um jovem a comer uma banana, ouvi uma polémica sobre um tema da IURD, sei que os bilhetes esgotaram em apenas algumas horas, sei que houve quem os vendesse por mais de 200 euros. Sei que a cidade de Guimarães, que há seis anos era Capital Europeia da Cultura, parou e foi, durante duas ou três horas, o centro do país com um holofote fixo em si.

Compreendo todo o revivalismo que estão a dar a este acontecimento, mais do que musical ou cultural, televisivo. Compreendo que o Salvador Sobral é um herói nacional até hoje para 90% da população portuguesa. Compreendo que gera e mexe com muita coisa, sobretudo, dinheiro. Mas pergunto-me: onde está o verdadeiro valor cultural ou musical nisto? Quais as músicas que lá foram apresentadas que não passam de temas em formato “genérico”? O que importa o Festival da Eurovisão, a não ser para ver um programa de música formato “corta e cose” e que depois mais ninguém ouve falar daquela gente?

As audiências e o mediatismo justificam tudo. O fluxo de dinheiro e o showbizz sobrepõem-se a tudo. É como uma rádio que tem de passar as mesmas músicas 500 vezes ao dia para ter ouvintes. Não condeno isso. O que me tira o sono é confundirem e ter ouvido tanta gente – sobretudo na classe política –  a chamar a um programa de televisão de “acontecimento cultural e musical do ano”. Meus caros: não é. É só aparato, vestidos bonitos e canções sem sal.

Tudo o resto, o que realmente importa, acaba por passar ao lado do tal holofote que se concentra onde lhe pagam mais para estar. A cultura não é um negócio e no dia que passar a ser, morre. Já esteve mais longe.

Sobre o Autor

Signo escorpião, sei informática na ótica do utilizador, programador do espaço cultural Banhos Velhos e sou um eterno amante de música, do cinema e do Sozinho em casa.

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