
A ética, a ideologia, a estética e a oratória são, para mim, pedras basilares da acção política. Os outrora apelidados “príncipes da política” – hoje senadores, pela sua idade e diria até, pela raridade de encontrarmos alguém com estas características, por serem uma preciosa “agulha no meio da palha”, por gerarem desconfiança entre um meio cada vez mais medíocre -, sempre a tiveram. Uns mais do que outros, é certo, mas todos capazes de nos fazer agarrar aos seus discursos e livros e decorá-los, como se da Magna Carta se tratasse.
A ética porque é necessário tê-la no exercício de um cargo em que o bem-comum deverá estar à frente de qualquer interesse partidário ou, devo acrescentar, forçosamente, pessoal.
A ideologia porque, apesar de me considerar um pouco naïf e acreditar que todos os actores políticos pretendem a melhoria da condição de vida das suas populações, é ela que nos mostra o caminho a seguir quando se tem plena consciência do objectivo, ainda que esse possa ser pela esquerda, centro ou direita. Outros há que definem o seu pensamento como a sua própria ideologia.
Depois vem a estética, a beleza na harmonia do seu propósito. A capacidade de respeitar o adversário, de lhe reconhecer o mérito e, só assim, permitir que as suas próprias competências sobressaiam. Do ponto de vista estético, no combate político, ele só é belo se existirem dois lados capazes de ganhar. Imaginem as linhas de Aljubarrota, Gravelines ou Waterloo. Quem poderia ganhar? É admirável porque todos o poderiam fazer e, transpondo para a política, é a aceitação dos factos, da vitória e da derrota, que nunca é efémera.
Por fim, a oratória. Hoje em dia ninguém a tem, escondida atrás do termo comunicação: são punchlines, soundbytes, copy para as redes sociais, para um mundo em constante redline. Alguém teria, hoje, a mesma capacidade de Norton de Matos, de estar horas a discursar perante a multidão no Porto?! Ou de Sá Carneiro, no conhecido discurso na Estalagem da Via Norte?!
Tudo isto me aviva a memória, hoje, com a morte de uma das pessoas que, pela sua acção política, mais me influenciou desde a juventude: Adriano Moreira.
A primeira memória que tenho do Sr. Professor foi numa entrevista concedida a Ana Sousa Dias e um dos temas da conversa abordava a importância que teve na tese “Estado, Administração Pública e Comunidade Europeia”, de Luís Sá. Luís Sá, para os mais esquecidos, foi um brilhante membro parlamentar do PCP, cunhalista convicto, apesar de toda a formação católica que teve. A esta hora poderão estar a perguntar-se “Então não eram adversários?”
Depois fui descobrindo algo que me deixou maravilhado e com fé no humanismo: o Estatuto do Indigenato. Avizinhou-se, de repente, tão simples na minha jovem mente, e questionei-me como é que ninguém tinha feito tal coisa?! Com seria possível as pessoas terem estatutos diferentes, apesar de terem nascido no mesmo país?!
No primeiro ano do Ciclo de Conferências do Rotary Club de Oliveira de Azeméis, o último convidado, em Junho ou Julho, foi Adriano Moreira. Que delícia! Por uma questão de saúde de um familiar, teria que voltar a Lisboa no final da conferência e eu, com pouco mais de trinta anos, recebi-o no Hotel Dighton às dezasseis horas e tive o prazer de ter estado à conversa com ele até às três da manhã do dia seguinte, quando o deixei à porta de sua casa.
A minha admiração por Adriano Moreira não irá desaparecer por já não estar entre nós, ela terá tendência para crescer, aliás, porque me apercebo que apesar de ter sido um conservador, ao ter-se tornado um conhecedor profundo da história do nosso país e da Europa, de ter estado toda a sua vida ligado às ciências sociais, à Academia, tudo isso deu-lhe uma dimensão de conhecimento que em muito e a todos nos ultrapassa. A isso, acresceu a sua humildade, típica de um transmontano, de um homem do século XX, do século do povo, que teve que estudar e trabalhar para alcançar tudo o que conseguiu.
Todos os elogios serão poucos para Adriano Moreira. Com a sua partida numa viagem para a luz, Portugal perdeu. Quero, contudo, acreditar que Adriano Moreira foi e continuará a ser um inspirador e que o orgulho e o estudo de Homens como Adriano Moreira é a maior homenagem que lhe podemos fazer, a ele e ao legado que nos deixa.
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Nota: O autor escreve segundo a antiga ortografia.
Sobre o autor:
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